24 novembro 2005

Fortaleza Digital

Neste fim de semana vou colocar trechos dos livros do Dan Brown - Leiam e comentem!!!!!!
Antes de estourar no mundo inteiro com O Código Da Vinci, Dan Brown já demonstrava um talento singular como contador de histórias no seu primeiro livro, Fortaleza Digital, lançado em 1998 nos Estados Unidos.
Muitos dos ingredientes que, anos depois, fariam com que o autor fosse reconhecido como um novo mestre dos livros de ação e suspense já estavam presentes no seu romance de estréia: a narrativa rápida, a trama repleta de reviravoltas que prendem o leitor da primeira à última página e o fascínio exercido por códigos secretos, criptografia e enigmas misteriosos.
Em Fortaleza Digital, Brown mergulha no intrigante universo dos serviços de informação e ambienta sua história na ultra-secreta e multibilionária NSA, a Agência de Segurança Nacional americana, mais poderosa do que a CIA ou qualquer outra organização de inteligência do mundo.
Quando o supercomputador da NSA, até então considerado uma arma invencível para decodificar mensagens terroristas transmitidas pela Internet, se depara com um novo código que não pode ser quebrado, a agência recorre à sua mais brilhante criptógrafa, a bela matemática Susan Fletcher.
Presa numa teia de segredos e mentiras, sem saber em quem confiar, Susan precisa encontrar a chave do engenhoso código para evitar o maior desastre da história da inteligência americana e para salvar a sua vida e a do homem que ama.
Uma corrida desesperada se desenrola paralelamente nos corredores do submundo do poder, nos arranha-céus de Tóquio e nas ruas de Sevilha. É uma batalha de vida ou morte que pode mudar para sempre o equilíbrio de forças no mundo.
"Fortaleza Digital é o melhor e mais realístico suspense tecnológico lançado em muitos anos. A habilidade de Dan Brown para tratar do conflito entre as liberdades individuais e as questões de segurança nacional é impressionante... Impossível não ficar arrepiado a cada página."*

Prólogo


Plaza de España
Sevilha, Espanha
11h da manhã

Dizem que, quando chega a hora da morte, tudo se torna claro. Ensei Tankado sabia agora que isso era verdade. Quando caiu no chão com fortes dores, apertando o peito com a mão, percebeu a dimensão terrível do seu erro.
Algumas pessoas se aproximaram, cercando-o e tentando ajudar. Mas Tankado não queria ajuda. Era tarde demais.
Levantou a mão esquerda, tremendo, e esticou os dedos. Olhem para a minha mão! As pessoas em volta olhavam, mas ele percebia que não estavam entendendo.
Em um de seus dedos havia um anel dourado entalhado. Por um breve instante, as inscrições do anel reluziram ao sol da Andaluzia. Ensei Tankado sabia que essa seria a última luz que jamais veria.

CAPÍTULO 1

Estavam no seu hotel preferido nas Smoky Mountains. David olhava para ela, sorrindo.
- Então, querida, o que me diz? Vamos nos casar?
Deitada na cama, ela devolveu o olhar. Aquele era o homem certo. Para sempre. Enquanto admirava seus profundos olhos verdes, em algum lugar distante uma campainha começou a tocar. Ela tentou abraçá-lo, mas seus braços encontraram apenas o vazio.
O ruído do telefone acabou despertando Susan Fletcher do seu sonho. Ela suspirou, sentou-se na cama e tateou em volta, procurando o telefone.
- Alô?
- Oi, Susan, é o David. Eu te acordei?
Ela sorriu, rolando na cama.
- Estava sonhando com você. Vem pra cá ficar comigo...
Ele riu.
- Ainda está escuro lá fora.
- Humm - ela murmurou, sensualmente -, então você tem mesmo que vir pra cá. Vamos brincar. Podemos dormir um pouco antes de viajar.
David soltou um suspiro de frustração.
- É por isso que estou ligando. Vamos ter que adiar nossa viagem.
Susan acordou totalmente, como se tivesse levado um soco.
- O quê?
- Mil desculpas. Vou ter que viajar, mas volto amanhã. Podemos partir para as montanhas bem cedo e ainda teremos dois dias.
- Mas já fiz as reservas - disse Susan, contrariada.
- Consegui nosso quarto predileto no Stone Manor.
- Eu sei, mas é que...
- Essa é uma data especial, íamos comemorar nossos seis meses. Você ainda lembra que estamos noivos, não é?
- Susan, não posso explicar os detalhes agora - ele suspirou. - Eles mandaram um carro que está me esperando lá fora. Ligo do avião e explico tudo depois.
- Avião? - perguntou, espantada. - O que está acontecendo? Por que a sua universidade...?
- Não é a universidade. Ligo depois e explico. Preciso ir agora, estão me chamando. Entro em contato assim que puder, prometo.
- David! - ela gritou. - O que está...
Ele já havia desligado.
Susan Fletcher ficou acordada durante horas, esperando que ele ligasse, mas o telefone não tocou.

***

Mais tarde, naquela mesma manhã, Susan sentia-se abandonada. Resolveu tomar um banho. Entrou na banheira e afundou a cabeça na água, tentando esquecer o Stone Manor e as Smoky Mountains. Onde será que ele está? Por que não ligou ainda?
Aos poucos, a água quente foi ficando morna, depois fria, e ela estava se preparando para sair do banho quando o telefone deu sinal de vida. Levantou-se com pressa, espalhando água pelo chão enquanto agarrava o aparelho que havia deixado sobre a pia.
- David?
- Não, é Strathmore - respondeu a voz do outro lado.
Susan desmoronou.
- Ah... - Foi incapaz de esconder seu desapontamento.
- Boa tarde, comandante.
- Você estava esperando alguém mais jovem, talvez? - ele respondeu, brincando.
- Não, senhor - disse Susan, desconcertada. - Não foi o que eu...
- Claro que sim! - ele disse, rindo. - David Becker é um bom sujeito. Não o deixe escapar.
- Obrigada, senhor.
O comandante mudou de tom e falou com uma voz grave:
- Susan, estou ligando porque preciso de você aqui. Imediatamente.
Ela tentou se concentrar.
- É sábado, senhor. Em geral nós não...
- Eu sei - ele disse calmamente. - Mas é uma emergência.
Susan sentou-se. Emergência? Era a primeira vez que ouvia o comandante Strathmore dizer isso. Uma emergência? No Departamento de Criptografia? Não conseguia imaginar o que poderia ser.
- S-sim, senhor. - Fez uma pausa. - Vou chegar aí o mais rápido possível.
- Não demore - disse Strathmore e desligou.
De pé, enrolada na toalha, Susan ficou olhando as gotas de água caírem sobre as roupas que havia cuidadosamente separado na noite anterior - shorts para usar em caminhadas, um suéter para as tardes frias da montanha e a nova lingerie que comprara para as noites tórridas. Deprimida, foi até o armário pegar uma blusa e uma saia. Uma emergência?
Enquanto descia as escadas, ela pensava no que mais poderia dar errado naquele dia.
Em breve iria descobrir.

CAPÍTULO 2




Trinta mil pés acima das águas plácidas do oceano, David Becker fixava o olhar, abatido, através da pequena janela oval do Learjet 60. O telefone de bordo não estava funcionando, e ele não pôde ligar para Susan.
O que estou fazendo aqui?, resmungou para si mesmo. A resposta era simples: há pessoas para as quais não se diz "não".
- Sr. Becker - disse uma voz pelo alto-falante -, chegaremos dentro de meia hora.
Becker balançou a cabeça melancolicamente ao ouvir a voz invisível. Excelente. Fechou a proteção da janela e tentou dormir. Mas só conseguia pensar em Susan.

CAPÍTULO 3

Susan parou seu Volvo logo abaixo da cerca de arame farpado de três metros de altura. Um jovem guarda apoiou as mãos no teto do carro.
- Sua identificação, por favor.
Susan lhe entregou o documento e olhou para o infinito, enquanto esperava o guarda passar seu cartão por um leitor computadorizado.
- Obrigado, senhorita Fletcher. - O guarda fez um sinal discreto e o portão se abriu.
Quinhentos metros à frente, Susan repetiu o procedimento diante de outra cerca de arame farpado igualmente imponente. Vamos, lá rapazes... Esta é só a milionésima vez que venho aqui.
Ao se aproximar da última guarita, um sentinela musculoso, segurando dois cães de guarda e uma metralhadora, olhou para sua placa e fez sinal para que prosseguisse. Ela seguiu a Canine Road por mais alguns metros, depois estacionou na área C, reservada para funcionários. Inacreditável, pensou. Eles têm 26 mil empregados e um orçamento de 12 milhões de dólares - será que não conseguem passar um fim de semana sem mim? Susan estacionou o carro na vaga e desligou o motor, contrariada.
Atravessou os impecáveis jardins, entrou no prédio, passou por mais duas verificações de segurança e finalmente chegou ao túnel sem janelas que levava à nova ala. Uma cabine com um sistema de reconhecimento de voz bloqueava sua passagem.
National Security Agency (NSA)
Departamento de criptografia
somente pessoal autorizado

O guarda armado olhou para ela.
- Boa tarde, senhorita Fletcher.
Susan sorriu, cansada.
- Oi, John.
- Não esperava vê-la aqui hoje.
- É, nem eu. - Ela se aproximou do microfone parabólico e disse, em voz clara: "Susan Fletcher." O computador reconheceu o espectro de freqüências de sua voz e o portão se abriu. Ela entrou.

***

O guarda observou Susan enquanto ela ia andando pelo corredor. Notou que seus vibrantes olhos castanhos pareciam meio distantes, mas seu rosto exibia um certo frescor, e os cabelos castanhos, na altura do ombro, ainda estavam úmidos. Ela deixava atrás de si um suave perfume de talco para bebês. O sentinela percorreu com os olhos suas costas bem torneadas, observando a blusa branca com a marca do sutiã quase invisível por baixo. Desceu o olhar pela saia até chegar às pernas - as famosas pernas de Susan Fletcher.
Difícil imaginar que elas sustentam um QI de 170, ele pensou.
Ficou olhando para ela por um bom tempo, até que sua silhueta sumiu ao longe.

***

Quando Susan chegou ao final do túnel, uma porta circular, parecida com a de um cofre, bloqueava sua passagem. Havia uma placa com letras grandes que dizia: criptografia.
Com um suspiro resignado, colocou a mão sobre o teclado numérico embutido na parede e digitou seu código pessoal de cinco dígitos. Alguns segundos depois, a porta de 12 toneladas de aço começou a girar. Susan tentava se concentrar, mas seus pensamentos acabavam voltando para ele.
David Becker. O único homem que havia amado em toda a sua vida. O mais jovem professor titular da Universidade de Georgetown, brilhante especialista em línguas estrangeiras e praticamente uma celebridade no mundo acadêmico. Dotado de uma memória prodigiosa e profundo amante das línguas, dominava seis dialetos da Ásia, assim como espanhol, francês e italiano. Suas palestras na universidade sobre etimologia e lingüística eram concorridíssimas, e ele geralmente se estendia muito além do horário para poder responder à enxurrada de perguntas da platéia. Falava com autoridade e entusiasmo, aparentando indiferença em relação aos olhares de admiração das suas alunas, fascinadas com um professor famoso.
Becker era um homem de 35 anos, moreno e forte, cheio de vitalidade. Tinha olhos verdes e uma inteligência à altura de seu porte. Seu queixo quadrado e feições bem marcadas faziam com que Susan se lembrasse de uma estátua de mármore. Com mais de um metro e oitenta de altura, jogava squash com uma rapidez que surpreendia seus colegas. Depois de massacrar seu oponente na quadra, ele costumava se refrescar enfiando a cabeça embaixo de um bebedouro e deixando a água escorrer pelo cabelo espesso e preto. Então, ainda pingando, em geral tomava uma vitamina de frutas com um sanduíche em companhia do adversário.
O salário que a universidade lhe pagava era modesto como o de qualquer outro professor em início de carreira. Algumas vezes, quando precisava renovar sua anuidade no clube de squash ou colocar um novo encordoamento de tripas em sua velha raquete Dunlop, conseguia algum dinheiro extra fazendo trabalhos de tradução para agências do governo em Washington ou nos arredores. Foi num desses trabalhos que conheceu Susan.
Era uma manhã fresca durante as férias de outono, e Becker voltava de sua corrida matinal para o apartamento de três quartos cedido pela universidade. Viu que havia recados na secretária eletrônica. Tomou um grande copo de suco de laranja enquanto ouvia o recado. A mensagem era parecida com muitas outras que já tinha recebido: uma agência do governo estava requisitando seus serviços de tradução naquela mesma manhã. A única coisa peculiar é que Becker nunca tinha ouvido falar dessa organização específica.
- É chamada de National Security Agency. Agência de Segurança Nacional - disse Becker, telefonando para alguns colegas em busca de informações.
A resposta era sempre a mesma:
- Você está falando do Conselho de Segurança Nacional?
Becker ouviu de novo a mensagem.
- Não. Eles disseram "agência". A sigla é NSA.
- Nunca ouvi falar.
Becker verificou a listagem oficial de agências e organizações governamentais, mas também não encontrou nada. Confuso, ligou para um de seus velhos companheiros de squash, um ex-analista político que trabalhava como assistente de pesquisa na Biblioteca do Congresso. David ficou um pouco chocado com a explicação.
Não apenas a NSA existia de fato, como era também considerada uma das organizações mais influentes do mundo. Coletava informações de inteligência de todo o planeta e protegia informações secretas norte-americanas há mais de 50 anos. Apenas 3% dos americanos tinham conhecimento de sua existência.
Seu amigo brincou com ele.
- NSA significa: Ninguém Sabe dessa Agência.
Preocupado e curioso ao mesmo tempo, Becker aceitou a oferta da agência misteriosa. Percorreu os 60 quilômetros até a central de operações da NSA, que ocupava 350 mil metros quadrados discretamente escondidos pelas verdejantes colinas de Fort Meade, em Maryland. Depois de ter passado por inúmeras verificações de segurança e ter recebido um passe de visitante com holograma, válido por seis horas, foi levado até um luxuoso laboratório onde lhe disseram que iria passar a tarde fornecendo "suporte cego" ao Departamento de Criptografia, um grupo de elite de gênios matemáticos responsáveis por decifrar todo tipo de códigos.
Durante uma hora, os criptógrafos pareciam não ter sequer notado que Becker estava presente. Iam e vinham em torno de uma enorme mesa e falavam usando termos que Becker nunca tinha ouvido antes. Falavam de cifras de fluxo, geradores autodecimados, variantes knapsack, protocolos de conhecimento zero, pontos de unicidade. Becker limitou-se a observar, completamente perdido. Rascunhavam símbolos em papel quadriculado, debruçavam-se sobre listagens de computadores e se referiam constantemente à massa ilegível de texto que estava sendo exibida no projetor.

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Após algum tempo, um deles aproximou-se e explicou a Becker aquilo que ele mesmo já havia deduzido. O texto todo bagunçado era um código - um texto cifrado, ou criptograma -, grupos de números e letras que representavam palavras encriptadas. O trabalho dos criptógrafos era estudar o código e extrair dali a mensagem original, ou mensagem clara. A NSA chamou Becker porque suspeitava que a mensagem tinha
sido escrita no dialeto mandarim da língua chinesa. Ele deveria traduzir os símbolos assim que os criptógrafos os decifrassem.
Durante duas horas, Becker interpretou uma sucessão sem fim de símbolos em mandarim. Mas todas as vezes que fazia uma tradução, os criptógrafos sacudiam a cabeça, em completo desespero. Aparentemente, o código não fazia sentido. Tentando ajudar da melhor forma possível, Becker lhes disse que todos os caracteres traduzidos até então tinham uma particularidade: eram caracteres Kanji. No mesmo instante o burburinho que tomava conta da sala cessou. O chefe das operações, um fumante inveterado e magricela chamado Morante, virou-se para Becker, espantado:
- Você quer dizer que estes símbolos possuem múltiplos significados?
Becker disse que sim. Explicou que Kanji era um sistema de escrita japonesa baseado em caracteres chineses modificados. Até então, ele estava traduzindo-os como se fossem mandarim porque era isso que lhe tinham pedido.
- Meu Deus! - disse Morante, tossindo. - Vamos tentar o Kanji.
Como num passe de mágica, subitamente tudo fez sentido.
Os criptógrafos ficaram muito impressionados, mas, ainda assim, fizeram com que Becker trabalhasse nos caracteres fora de ordem.
- É para sua própria proteção - disse Morante. - Assim você não tem como saber o que está traduzindo.
Becker riu. Mas ninguém à sua volta estava rindo.
Quando o código finalmente foi quebrado, Becker não tinha idéia dos segredos sombrios que teria ajudado a revelar, mas uma coisa era certa: a NSA levava aquele assunto muito a sério. O cheque que lhe deram equivalia a mais de um mês de seu salário na universidade.
Quando estava saindo, passando pelos muitos postos de segurança ao longo do corredor principal, sua passagem foi bloqueada por um guarda que acabara de desligar o telefone.
- Sr. Becker, aguarde aqui, por favor.
- Algum problema? - Becker não esperava que o trabalho demorasse tanto e estava começando a se atrasar para sua partida de squash dos sábados à tarde.
- A chefe da Criptografia quer falar com você. Ela está vindo para cá - disse o guarda.
Ela? - Becker riu. Não tinha visto nenhuma mulher desde que pisara na NSA.
- Há algo de errado nisso? - disse uma voz feminina atrás dele.
Becker virou-se e sentiu o rosto corar. Olhou para o crachá na blusa da mulher. A chefe do Departamento de Criptografia da NSA não era só uma mulher, era uma linda mulher.
- Não - ele disse, atrapalhando-se com as palavras. - Eu só...
- Susan Fletcher - disse ela, sorrindo e estendendo-lhe a mão delicada.
Becker cumprimentou-a.
- David Becker.
- Parabéns, Sr. Becker, soube que fez um bom trabalho hoje. Podemos conversar um pouco?
Ele hesitou.
- Na verdade, estou com um pouco de pressa. - Ficou pensando se era realmente sensato não dar atenção à agência de inteligência mais poderosa do mundo, mas sua partida de squash iria começar em pouco menos de uma hora e ele tinha uma reputação a manter: David Becker jamais se atrasava para o squash... Para as aulas, talvez, mas nunca para o squash.
- Serei breve - disse Susan Fletcher, sorridente. - Por aqui, por favor.
Dez minutos depois, Becker estava na cantina da NSA, comendo salgadinhos e tomando um suco de frutas com a adorável chefe da Criptografia. David percebeu rapidamente que aquela moça de 38 anos não estava ocupando um alto cargo na NSA por mero acaso: era uma das mulheres mais inteligentes que já havia encontrado. Enquanto conversavam sobre códigos e como decifrá-los, Becker teve que se esforçar para não se perder na conversa, o que era uma experiência nova e estimulante para ele.
Um hora depois, quando Becker já tinha deixado de lado sua partida de squash, e Susan, por sua vez, havia ignorado completamente três chamadas pelo sistema interno de comunicação, ambos estavam achando tudo aquilo muito engraçado. Lá estavam eles, duas mentes altamente racionais e analíticas, supostamente imunes a paixões súbitas, mas, enquanto discutiam morfologia, lingüística e geradores de números pseudo-aleatórios, sentiam-se como um casal de adolescentes, como se houvesse fogos estourando a seu redor.
Naquele dia, Susan não chegou a tocar no assunto pelo qual havia originalmente chamado David para aquela conversa: queria convidá-lo para trabalhar, durante um período de teste, na Divisão de Criptografia Asiática. Mas o jovem professor falava com tanta paixão de suas aulas que Susan percebeu que ele nunca deixaria a universidade. E não quis estragar o clima com assuntos de negócios. Sentia-se novamente como uma adolescente e não queria que nada atrapalhasse isso. E assim foi.

***

A fase inicial do relacionamento foi lenta e romântica: momentos roubados sempre que as agendas de ambos permitiam, longos passeios pelo campus da Universidade de Georgetown, um café já tarde da noite no Merlutti, algumas palestras e concertos. Susan percebeu que nunca tinha rido tanto em sua vida. David conseguia fazer com que todas as coisas parecessem engraçadas. Era uma boa forma de relaxar da tensão do trabalho na NSA.
Ela adorava se lembrar de uma tarde fresca de outono em que os dois ficaram assistindo a uma partida de futebol e falando bobagem.
- Qual é mesmo o esporte que você disse que pratica? - perguntou Susan, zombeteira. - Splash? É na água?
Becker olhou torto para ela:
- Chama-se squash.
Ela lançou um olhar vago, como se não houvesse entendido.
- É parecido com tênis, mas a quadra é menor - ele continuou.
Susan encostou o ombro no dele, carinhosamente.
- E você? - perguntou Becker. - Pratica algum esporte?
- Sou faixa-preta em spinning.
Becker fez cara de total desprezo.
- Prefiro esportes onde se possa vencer.
Susan sorriu.
- Conheço alguém que é competitivo...
Susan chegou mais perto de Becker e sussurrou no ouvido dele:
- Doutor.
Ele virou-se e olhou para ela, sem entender.
- Doutor - ela repetiu. - Me diga a primeira coisa que lhe vier à cabeça.
Becker continuava olhando, meio desconfiado.
- Livre associação?
- Procedimento-padrão da NSA. Preciso saber com quem estou andando... - Ela olhou para ele muito seriamente e repetiu:
- Doutor.
Becker deu de ombros.
- Seuss, o dos livros infantis.
Susan olhou de volta com um sorriso torto.
- Tá bom, vamos tentar outra: cozinha.
Ele não hesitou:
- Quarto.
Susan levantou as sobrancelhas.
- Mais uma... gato.
- Tripas.
- Tripas?
- É. Tripas... Mais especificamente, tripa de gato. É o encordoamento de raquetes de squash usado por todos os campeões.
- Que simpático - ela resmungou.
- Seu diagnóstico? - perguntou Becker.
Susan refletiu e disse:
- Você é infantil, viciado em squash e sexualmente frustrado.
Becker deu de ombros.
- Acho que é mais ou menos isso.

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