21 abril 2006

O caçador de pipas

A dica de livro é... O caçador de pipas best seller mundial ao tratar da história de dois amigos, tendo como pano de fundo a história recente do Afeganistão. Khaled Hosseini é um médico afegão filho de diplomata que vive nos EUA há 25 anos, desde que sua família fugiu dos soviéticos. O que o levou, aos 40 anos, a escrever seu primeiro romance? Creio que as conseqüências do 11 de setembro (retratadas no livro) despertaram suas memórias de infância e de adolescência. É uma obra poderosa, que está sendo adaptada ao cinema. E o primeiro capitulo você lê aqui e agora!


Este livro é dedicado a Haris e Farah, a noor dos meus olhos, e às crianças do Afeganistão.


UM

Dezembro de 2001

EU ME TORNEI O QUE SOU HOJE aos doze anos, em um dia nublado e gélido do inverno de 1975. Lembro do momento exato em que isso aconteceu, quando estava agachado por detrás de uma parede de barro parcialmente desmoronada, espiando o beco que fi cava perto do riacho congelado. Foi há muito tempo, mas descobri que não é verdade o que dizem a respeito do passado, essa história de que podemos enterrá-lo. Porque, de um jeito ou de outro, ele sempre consegue escapar. Olhando para trás, agora, percebo que passei os últimos vinte e seis anos da minha vida espiando aquele beco deserto.
Um dia, no verão passado, meu amigo Rahim Khan me ligou do Paquistão. Pediu que eu fosse vê-lo. Parado ali na cozinha, com o fone no ouvido, sabia muito bem que não era só Rahim Khan que estava do outro lado daquela linha. Era o meu passado de pecados não expiados. Depois que desliguei, fui passear pelo lago Spreckels, 10 KHALED HOSSEINI na orla norte do parque da Golden Gate. O sol do início da tarde cintilava na água onde navegavam dezenas de barquinhos em miniatura, impulsionados por um ventinho ligeiro. Olhei então para cima e vi um par de pipas vermelhas planando no ar, com rabiolas compridas e azuis. Dançavam lá no alto, bem acima das árvores da ponta oeste do parque, por sobre os moinhos, voando lado a lado como um par de olhos fi tando San Francisco, a cidade que eu agora chamava de lar. E, de repente, a voz de Hassan sussurrou nos meus ouvidos: “Por você, faria isso mil vezes!” Hassan, o menino de lábio leporino que corria atrás das pipas como ninguém. Sentei em um banco do parque, perto de um salgueiro. Pensei em uma coisa que Rahim Khan disse um pouco antes de desligar, quase como algo que lhe houvesse ocorrido no último minuto. “Há um jeito de ser bom de novo.” Ergui os olhos para as pipas gêmeas. Pensei em Hassan. Pensei em baba. Em Ali. Em Cabul. Pensei na vida que eu levava até que aquele inverno de 1975 chegou para mudar tudo. E fez de mim o que sou hoje.

DOIS

QUANDO ÉRAMOS CRIANÇAS, HASSAN e eu trepávamos nos choupos da entrada da casa de meu pai e fi cávamos chateando os vizinhos, usando um caco de espelho para mandar refl exos de sol para as suas casas. Sentávamos um defronte do outro, nos galhos mais altos, com os pés descalços pendurados no ar e os bolsos das calças cheios de amoras e nozes secas. Ficávamos nos alternando com o espelho enquanto comíamos amoras, jogando os frutos um no outro, entre risinhos e gargalhadas. Ainda posso ver Hassan encarapitado naquela árvore, com o refl exo do sol faiscando por entre as folhas no seu rosto quase perfeitamente redondo, um rosto de boneca chinesa talhado em madeira de lei: o nariz grande e chato, os olhos puxados e oblíquos como folhas de bambu, uns olhos que, dependendo da luz, pareciam dourados, verdes e até cor de safi ra. Ainda posso ver as suas orelhas miúdas, dobradas feito conchas, e a protuberância do queixo, um 12 KHALED HOSSEINI apêndice de carne que parecia ter sido acrescentado como simples lembrança de última hora. E o lábio fendido, bem naquela linha do meio, em um ponto em que a ferramenta escorregou, ou, quem sabe, foi apenas porque o artesão das bonecas chinesas já estava cansado e se descuidou. Às vezes, lá no alto daquelas árvores, dizia para Hassan pegar o estilingue e atirar nozes no pastor alemão caolho do vizinho. Ele não queria, mas, se eu pedisse, pedisse de verdade, ele não me diria não. Hassan nunca me negava nada. E era fera com a atiradeira. Seu pai, Ali, sempre nos apanhava e fi cava furioso, ou tão furioso quanto possível, no caso de alguém gentil como Ali. Com o dedo em riste, mandava que descêssemos da árvore. Pegava o espelho e repetia o que sua mãe lhe dizia: que o diabo também faz os espelhos reluzirem, e faz isso para distrair os muçulmanos durante as orações.
— E ri, depois que já conseguiu o que queria — acrescentava ele invariavelmente, olhando para o fi lho com ar severo.
— Está bem, pai — murmurava Hassan, fi tando os próprios pés. Mas ele nunca me entregava. Nunca disse que tanto o espelho quanto as nozes atiradas no cachorro do vizinho tinham sido idéia minha. Os choupos margeavam o caminho de tijolos vermelhos que levava a um portão de duas folhas, todo feito de ferro fundido. Por seu turno, este se abria para a rua que dava acesso à propriedade de meu pai. A casa fi cava à esquerda, e tinha um quintal nos fundos. Todos eram unânimes em dizer que meu pai, o meu baba, tinha construído a casa mais bonita do distrito de Wazir Akbar Khan, um bairro novo e rico ao norte de Cabul. Havia até quem dissesse que era a casa mais bonita de toda a cidade. Uma ampla alameda ladeada por roseiras conduzia à casa espaçosa, com piso de mármore e janelas enormes. Intrincados mosaicos de ladrilhos, que baba escolheu a dedo em Isfahan, recobriam o chão dos quatro banheiros. Tapeçarias com fi os dourados, que baba comprou em Calcutá, revestiam as paredes. E um lustre de cristal pendia do teto abobadado. Meu quarto fi cava no andar de cima, junto com o de meu pai e o seu escritório, também conhecido como “sala de fumar”, eternamente cheirando a tabaco e canela. Era lá que baba e seus amigos se reclinavam nas poltronas de couro preto depois que Ali tinha acabado de servir o jantar. 13 O CAÇADOR DE PIPAS Todos enchiam os cachimbos — só que meu pai sempre dizia “engordar o cachimbo” — e conversavam sobre os seus três assuntos favoritos: política, negócios, futebol. Às vezes eu perguntava se podia ir sentar lá, junto com eles, mas baba fi cava parado na porta. — Agora, vá — dizia ele. — Isso é coisa de gente grande. Por que não vai ler um daqueles seus livros? — Fechava a porta e me deixava imaginando por que, com ele, tudo era sempre coisa de gente grande. Sentava junto da porta, abraçando os joelhos contra o peito. Algumas vezes fi cava sentado ali uma hora, outras vezes, duas, ouvindo as conversas e os risos deles. A sala de estar, no andar térreo, tinha uma parede em arco, com estantes feitas sob medida. Nelas fi cavam os porta-retratos com as fotos de família: uma foto antiga e desbotada de meu avô com o rei Nadir Shah, tirada em 1931, dois anos antes do assassinato do rei; estavam parados junto de um veado morto, ambos usando botas de cano alto e com rifl es pendurados nos ombros. Tinha uma foto da festa do casamento de meus pais: baba todo elegante em seu terno preto e minha mãe, uma princesinha sorridente, vestida de branco. Ao lado, baba e seu sócio e melhor amigo, Rahim Khan, parados diante da nossa casa. Nenhum dos dois está sorrindo. Nessa foto, sou um bebê, no colo de meu pai, que tem um ar sério e cansado. Estou em seus braços, mas é o mindinho de Rahim Khan que os meus dedos estão segurando. Essa parede em arco dava para a sala de jantar em cujo centro havia uma mesa de mogno com espaço de sobra para trinta convidados — e, considerando-se o gosto de meu pai por festas extravagantes, era exatamente isto que acontecia quase toda semana. Na outra ponta da sala, fi cava uma grande lareira de mármore, sempre iluminada pelo brilho alaranjado do fogo durante todo o inverno. Uma grande porta de correr, envidraçada, se abria para uma varanda em semicírculo que dava para os oito metros quadrados de terreno e as aléias de cerejeiras. Baba e Ali tinham feito uma horta perto do muro que fi cava do lado leste: plantaram tomates, hortelã, pimenta e uma fi leira de milho que nunca pegou de verdade. Hassan e eu chamávamos aquele canto de “muro do milho doente”. Na parte sul do jardim, à sombra de um pé de nêspera, fi cava a casa dos empregados, uma casinha modesta onde Hassan morava com o pai. 14 KHALED HOSSEINI Foi ali, naquele pequeno casebre, que Hassan nasceu no inverno de 1964, um ano depois que minha mãe morreu durante o meu parto. Nos dezoito anos que vivi em Cabul, só entrei na casa de Ali e Hassan umas poucas vezes. Quando o sol começava a se pôr atrás das colinas, e tínhamos acabado de brincar, nos separávamos. Eu passava pelas roseiras a caminho da mansão de baba, Hassan ia para a casinha de pau-a-pique onde nasceu e morou por toda a vida. Lembro que ela era minúscula, limpa e fracamente iluminada por dois ou três lampiões de querosene. Havia dois colchões, em lados opostos da sala, um velho tapete Herati, com uns rasgões no meio, um tamborete de três pernas e, em um canto, uma mesa de madeira onde Hassan fazia os seus desenhos. As paredes eram nuas, exceto por uma única tapeçaria bordada com contas que formavam as palavras Allah-u-akbar. Um presente que baba trouxe para Ali de uma de suas viagens a Mashad. Foi nesse casebre que Sanaubar deu à luz Hassan, em um dia frio do inverno de 1964. Enquanto minha mãe morreu de hemorragia durante o parto, Hassan perdeu a sua menos de uma semana depois de nascer. E para um destino que a maioria dos afegãos considera pior que a morte: ela fugiu com uma trupe de cantores e dançarinos ambulantes. Hassan nunca falou da mãe, como se ela jamais tivesse existido. Sempre me perguntei se sonharia com ela, se tentaria saber que aparência tinha, por onde andaria. Ficava imaginando se gostaria de conhecê-la. Teria saudade dela, como eu tinha da mãe que não conheci? Certo dia, quando estávamos indo da casa de meu pai ao cinema Zainab, ver um novo fi lme iraniano, cortamos caminho pelo acampamento militar perto da escola secundária Istiqlal. Baba tinha nos proibido de passar por aquele local, mas, nessa época, ele estava no Paquistão com Rahim Khan. Pulamos a cerca que rodeava o acampamento, saltamos um pequeno regato e chegamos ao terreno enlameado onde velhos tanques abandonados fi cavam acumulando poeira. À sombra de um desses tanques, havia um grupo de soldados fumando e jogando cartas. Um deles nos viu, fez sinal ao companheiro que estava ao seu lado e chamou por Hassan. — Ei! — exclamou ele. — Conheço você. 15 O CAÇADOR DE PIPAS Nunca tínhamos visto aquele sujeito antes. Era um homem atarracado, de cabeça raspada e barba por fazer. O seu jeito de nos olhar e o sorriso que deu me apavoraram. — Continue andando — murmurei para Hassan. — Ei, hazara! Olhe para mim. Estou falando com você! — berrou o soldado. Entregou o cigarro ao sujeito que estava ao seu lado, e fez um círculo com o polegar e o indicador de uma das mãos. Depois, meteu o dedo médio da outra mão naquele círculo. E fi cou enfi ando e tirando o dedo. Enfi ando e tirando. — Sabia que conheci sua mãe? Conheci muito bem. Peguei ela por trás, perto daquele riacho logo ali. Os outros soldados riram. Um deles fez um barulho que parecia um guincho. Eu disse a Hassan para continuar andando, continuar andando. — Que bocetinha gostosa que ela tinha! — disse o soldado, apertando as mãos dos outros, rindo. Mais tarde, no escuro, depois que o fi lme já tinha começado, ouvi Hassan fungando ao meu lado. As lágrimas lhe escorriam pelo rosto. Cheguei mais perto, passei o braço por suas costas e o puxei para mim. Ele encostou a cabeça no meu ombro. — Aquele cara confundiu você com outra pessoa — sussurrei. — Confundiu, sim. Pelo que me disseram, ninguém se surpreendeu realmente quando Sanaubar fugiu. Na verdade, o que deixou todo mundo espantadíssimo foi quando Ali, um homem que sabia o Corão de cor, se casou com Sanaubar, uma mulher dezenove anos mais jovem, linda, mas sabidamente sem escrúpulos, que vivia de sua reputação nada honrosa. Como Ali, ela era uma muçulmana shi’a, da etnia hazara. Era também sua prima-irmã e, portanto, seria natural que fosse escolhida para ser sua esposa. Mas, afora isso, Ali e Sanaubar tinham muito pouco em comum, principalmente em termos de aparência. Enquanto os olhos verdes brilhantes e o rosto malicioso de Sanaubar haviam, segundo consta, atraído inúmeros homens para o pecado, Ali tinha uma paralisia congênita dos músculos faciais inferiores, o que o tornava incapaz de sorrir e lhe dava um ar constantemente carrancudo. Era muito estranho ver Ali feliz, ou triste, pois, no seu rosto enrijecido, 16 KHALED HOSSEINI apenas os olhos castanhos e oblíquos brilhavam com um sorriso ou se umedeciam com a tristeza. Dizem que os olhos são as janelas da alma. Isso nunca foi tão verdadeiro como no caso de Ali, que só podia se revelar através deles. Ouvi dizer que o andar sugestivo e o rebolado de Sanaubar faziam os homens sonharem com infi delidade. Mas a pólio deixou Ali com a perna direita atrofi ada e torta, pura pele colada nos ossos, com apenas uma camada de músculos fi na que nem papel. Lembro de um dia, quando eu tinha oito anos, e Ali estava me levando ao bazaar para comprar naan. Eu ia caminhando atrás dele, cantarolando e tentando imitar o seu andar. Vi que balançava a perna descarnada, fazendo um movimento circular; vi que todo o seu corpo despencava para a direita cada vez que ele punha esse pé no chão. Parecia um verdadeiro milagre ele não cair a cada passo que dava. Quando tentei fazer a mesma coisa, quase me estatelei na sarjeta. E comecei a rir. Ali se virou e me pegou imitando o seu andar. Não disse nada. Nem na hora, nem nunca. Apenas continuou andando. A cara de Ali e o seu jeito de andar assustavam algumas das crianças menores da vizinhança. Mas o maior problema era mesmo com os meninos mais velhos. Corriam atrás dele na rua e debochavam quando passava cambaleando. Alguns deram para chamá-lo Babalu, ou Bicho-Papão. — Ei, Babalu, quem você comeu hoje? — gritavam eles em meio a um coro de risadas. — Quem você comeu, seu Babalu de nariz achatado? Falavam do nariz achatado porque tanto Ali quanto Hassan tinham os traços mongolóides característicos dos hazaras. Durante anos, isso foi tudo o que soube a respeito desse povo: que descendiam dos mongóis e eram parecidos com os chineses. Os livros didáticos raramente os mencionavam e só se referiam às suas origens de passagem. Até que um dia, quando estava bisbilhotando as coisas de baba no seu escritório, encontrei um dos velhos livros de história de minha mãe. O autor era um iraniano chamado Khorami. Soprei a poeira que o cobria, levei-o comigo para a cama naquela noite e fi quei espantadíssimo ao ver um capítulo inteiro sobre a história dos hazaras. Um capítulo inteiro dedicado ao povo de Hassan! Foi aí que fi quei 17 O CAÇADOR DE PIPAS sabendo que meu povo, os pashtuns, tinha perseguido e oprimido os hazaras. Li que estes tentaram se rebelar contra os pashtuns no século XIX, mas foram “dominados com violência indescritível”. O livro dizia ainda que meu povo matou os hazaras, expulsou-os das suas terras, queimou as suas casas e vendeu as suas mulheres como escravas. Dizia também que essa opressão de um povo pelo outro se deveu em parte ao fato de os pashtuns serem muçulmanos sunni, ao passo que os hazaras são shi’a. O livro falava de muitas coisas que eu não sabia, de coisas que os professores não mencionavam. Coisas que baba também não mencionava. Por outro lado, falava de coisas que eu sabia, como, por exemplo, que as pessoas chamavam os hazaras de “comedores de camundongos”, “nariz achatado”, “burros de carga”. Já tinha ouvido alguns meninos da vizinhança gritarem essas palavras para Hassan. Na semana seguinte, depois da aula, mostrei o tal livro ao meu professor e indiquei o capítulo sobre os hazaras. Ele passou os olhos por algumas páginas, deu uma risadinha e me devolveu o livro. — É só isso que essa gente shi’a sabe fazer bem — comentou, juntando os seus papéis —, posar de mártires. — Franziu o nariz quando pronunciou a palavra shi’a, como se estivesse se referindo a uma espécie de doença. Mas, apesar de ter a mesma herança étnica e o mesmo sangue de família, Sanaubar fazia coro com as crianças da vizinhança que debochavam de Ali. Ouvi dizer que não escondia de ninguém o desprezo que sentia pela aparência dele. — Isso lá é homem que se apresente? — zombava. — Já vi burros velhos que dariam maridos bem melhores. Afi nal de contas, quase todos desconfi avam que o casamento tinha sido uma espécie de arranjo entre Ali e seu tio, o pai de Sanaubar. Dizia-se que Ali tinha se casado com a prima para ajudar a salvar um pouco da honra do nome já manchado do tio, muito embora Ali, órfão desde os cinco anos, não tivesse nenhum bem ou herança em especial. Ele nunca tentou se vingar de nenhum dos seus algozes. Em parte, suponho eu, porque jamais conseguiria alcançá-los arrastando atrás de si aquela perna torta. Mas principalmente porque era imune aos 18 KHALED HOSSEINI insultos dos seus agressores; tinha encontrado a alegria, o antídoto para qualquer sofrimento no momento em que Sanaubar deu à luz Hassan. Foi tudo muito simples. Sem obstetras, sem anestesistas, sem aqueles extravagantes aparelhos de monitoramento. Apenas Sanaubar, deitada em um colchão manchado e sem lençóis, tendo Ali e a parteira para ajudá-la. E não precisou de muita ajuda, pois, já ao nascer, Hassan foi fi el à sua natureza: era incapaz de machucar quem quer que fosse. Uns poucos grunhidos, um ou dois empurrões, e Hassan saiu. Saiu sorrindo. Segundo confi denciou a parteira tagarela ao criado do vizinho, que, por sua vez, se encarregou de espalhar para quem quisesse ouvir, Sanaubar teria dado uma olhada no bebê que Ali segurava no colo e, ao ver o lábio fendido, teria exclamado com um risinho amargo: — Pronto — teria dito ela. — Agora você tem esse seu fi lho idiota para fi car sorrindo para você! — Não quis nem mesmo segurar Hassan e, cinco dias depois, foi-se embora. Baba contratou a mesma ama-de-leite que tinha me amamentado para cuidar de Hassan. Ali nos disse que ela era uma hazara de olhos azuis, natural de Bamiyan, a cidade das estátuas dos Budas gigantes. — Que voz doce e melodiosa ela tinha... — era o que costumava nos dizer. Hassan e eu sempre perguntávamos o que ela cantava, embora já estivéssemos cansados de saber: ele nos contou essa história milhares de vezes. Só queríamos ouvir Ali cantando. Ele pigarreava e começava: De pé, no topo da mais alta das montanhas, Chamei por Ali, o Leão de Deus Ó Ali, Leão de Deus, Rei dos Homens, Traze alegria para os nossos corações Que tanto sofrem. Depois repetia que as pessoas que mamavam no mesmo peito eram como irmãs, ligadas por uma espécie de parentesco que nem mesmo o tempo poderia desfazer. Hassan e eu mamamos no mesmo peito. Demos os nossos primeiros passos na mesma grama do mesmo quintal. E, sob o mesmo teto, dissemos nossas primeiras palavras. 19 O CAÇADOR DE PIPAS A minha foi baba. A dele, Amir. O meu nome. Olhando para trás, agora, fi co pensando que os alicerces do que aconteceu no inverno de 1975 — e de tudo o que veio depois — já estavam contidos nessas primeiras palavras.

20 abril 2006

Sandy & Junior?


Depois de quase três anos sem disco novo, Sandy e Junior presenteiam seus fãs com 12 novas músicas. Em duas edições uma convencional e outra com DVD. Na edição especial, que vem dentro de uma luva de cartão com a imagem da capa recortada, e traz um CD e um DVD. O DVD apresenta um documentário de 22 minutos com os bastidores da gravação, além das 12 músicas do CD mixadas. Com um repertório renovado - cheio de ousadia - o novo projeto confirma a veia poética de Sandy, que assina a maioria das composições e firma-se cada vez mais como intérprete. Junior, cuja voz está mais presente do que nunca, co-dirige a produção e participa ativamente como instrumentista. O projeto gráfico é um grande diferencial do lançamento: um símbolo universal substitui a imagem e o nome dos artistas. Essa é uma aposta corajosa e inovadora da dupla, que cada vez mais assume a frente de seus projetos. Esse trabalho único, que ninguém deve deixar de conferir! Claro que o blog saiu na frente e tras 30' de cada faixapra você ouvir primeiro!
Tracklist
1. Estranho Jeito de Amar (ouça 30')
2. Replay (Slip Away) (ouça 30')
3. Tudo Pra Você (ouça 30')
4. Dessa Vez (ouça 30')
5. Discutível Perfeição (ouça 30')
6. Ida Nem Volta ( Ida Ni Vuelta) (ouça 30')
7. Você Não Banca o Meu Sim (ouça 30')
8. Nós Dois no Abismo (ouça 30')
9. O Preço (ouça 30')
10. Destinos (ouça 30')
11. Nas Mãos da Sorte (Com Milton Nascimento & Taboo - Black Eyed Peas) (ouça 30')
12. Último (ouça 30')

O Rappa Acustico Platinado!



Formado por Falcão (vocais), Xandão (guitarra), Lauro Farias (baixo) e Marcelo Lobato (bateria), O Rappa encarou o desafio do Acústico MTV e presenteou seus fãs, fazendo deste álbum, um trabalho único .O show foi gravado nos dias 15 e 16 de Junho de Outubro de 2005 em São Paulo. Neste trabalho, 14 faixas fazem a galera ir ao delirio na edição normal que rendeu disco de platina ao grupo! por essa razão a Warner Music Brasil está lançando um edição comemorativa em edição dupla com um disco bônus com mais 5 faixas somando no total 19 faixas, das quais três são interativas com videoclipe. O melhor da carreira da banda está aqui. Confira esta revolução na sonoridade de um dos grupos mais queridos do Brasil. Absolutamente imperdível!

Disco 1

1. Na Frente do Reto
2. Mar de Gente
3. Brixton, Bronx ou Baixada
4. Homem Amarelo
5. Lado B, Lado a
6. Reza Vela
7. Se Não Avisar o Bicho Pega
8. Rodo Cotidiano
9. Não Perca as Crianças de Vista
10. Pescador de Ilusões
11. O Salto
12. Papo de Surdo e Mudo
13. Eu Quero Ver Gol

Disco 2

1. Bitterusso Champagne
2. Mitologia Gerimum3. O Novo Já Nasce Velho
4. O que Sobrou do Céu
5. Cristo e Oxalá
6. Me Deixa

Também disponível em DVD

Faixas:
1. Na Frente do Reto
2. Mar de Gente
3. Bitterusso Champagne
4. Brixton, Bronx ou Baixada
5. Homem Amarelo - Part. Espec. Siba
6. Mitologia Gerimun - Part. Espec. Siba
7. Lado B Lado A
8. O Novo Já Nasce Velho
9. Reza Vela
10. Se Não Avisar o Bicho Pega
11. O Que Sobrou do Céu - Part. Espec. Maria Rita
12. Rodo Cotidiano - Part. Espec. Maria Rita
13. Não Perca As Crianças de Vista
14. Pescador de Ilusões
15. O Salto
16. Cristo e Oxalá - Part. Espec. Siba
17. Papo de Surdo e Mudo
18. Me Deixa
19. Eu Quero Ver Gol

Extras:
- Apelidos
- DJ
- Fotos
- Instrumentos

18 abril 2006

Novos parceiros!

A partir de hoje o site de busca "Buscapé" é um dos nossos parceiros juntamente com o "Último segundo"(do IG), Radio Rox, Campanha Nacional Contra a Pedofilia e claro o blogger que nos hospeda!

16 abril 2006

Abalou (Remix)



Um remixzinho pra alegrar seu findi!..rs
Abalou (DJ Marcos Sara Club Mix)
Clique na foto pro download!

Kelly Clarkson Remix

v

Kelly Clarkson-Because Of You(ProgressiveMix D.JDê) Mais uma versãozinha, espero que gostem...

Já sabem clique na foto pra fazero download!

09 abril 2006

Update!

O blog agora também tem busca e 'Últimas notícias' direto do site 'ùltimo segundo' do IG, a pouco tempo o blog também proporciona música online através da Radio Rox com programação bem variada, aqui você também pode fazer seu pedido de música,para isto basta clicar em 'pedidos' no display da radio e dá pra conferir a grade de programas cliando no logo da rádio. Lembrando que a rádio não é minha e também não tenho autonomia sobre ela. breve mais atualizações e parceirias. gostou? não gostou? opine! comente!

08 abril 2006

A volta do RHCP



Eles estão de volta! Red Hot Chili Peppers ouçam agora seu novo single Dani California!

clique na capa pra ouvir a música

01 abril 2006

Por que amamos


Faz tempo que não coloco um ' primeiro capitulo' então posto um agora que achei interessante, este texto está disponível no site Veja

Trecho do livro Por que Amamos,de Helen Fisher

"O fogo atravessa meu corpo — a dor de amar a ti. A dor atravessa meu corpo com as chamas de meu amor por ti. A enfermidade ronda meu corpo com meu amor por ti. A dor como de uma pústula prestes a se romper com meu amor por ti. Consumido pelo fogo de meu amor por ti. Lembro-me do que disseste a mim. Estou pensando em teu amor por mim. Eu me dilacero por teu amor por mim. Dor e mais dor. Para onde vais com meu amor? Disseram-me que ias partir. Disseram-me que me deixarias aqui. Meu corpo está entorpecido de pesar. Lembra-te do que eu disse, meu amor. Adeus, meu amor, adeus."1 Assim falou um índio kwakiutl do sul do Alasca em seu poema arrebatador, transcrito da língua nativa em 1896.
Quantos homens e mulheres amaram-se em todas as épocas que antecederam a mim e a você? Quantos de seus sonhos foram realizados; quantas de suas paixões desperdiçadas? Com freqüência, quando caminho ou me sento para meditar, maravilho-me com todos os casos de amor que este planeta absorveu. Felizmente, homens e mulheres de todo o mundo nos deixaram muitas provas de sua vida romântica.
De Uruk, um sumério antigo, chegam poemas em tábuas cuneiformes que saúdam a paixão de Inanna, rainha da Suméria, por Dumuzi, um pastor. "Meu amado, o deleite de meus olhos", lamenta Inanna para ele mais de quatro mil anos atrás.2
Os textos védicos e outros textos indianos, os mais antigos datando de 1000 e de 700 a.C., falam de Shiva, o mítico Senhor do Universo, que se apaixonou por Sati, uma jovem indiana. O deus reflete que "viu Sati e a si mesmo no pináculo de uma montanha/ enlaçados em amor".3
Para alguns, a felicidade jamais chegaria. Assim foi para Qays, filho de um chefe tribal na antiga Arábia. Uma lenda árabe, datando do século VII d.C., diz que Qays era um rapaz bonito e brilhante — até conhecer Laila, que significa "noite", devido a seus cabelos pretos como azeviche.4 Qays ficou tão inebriado que um dia saltou de sua carteira escolar para correr pelas ruas gritando o nome dela. Desde então ele ficou conhecido como Majnun, ou louco. Logo Majnun começou a vagar pelas areias do deserto, morando em cavernas com os animais, cantando versos a sua amada, enquanto Laila, enclausurada na tenda do pai, escapulia à noite para atirar bilhetes de amor ao vento. Um transeunte solidário levaria estes apelos ao jovem poeta desgrenhado e seminu. Sua paixão mútua por fim levaria à guerra entre as duas tribos — e à morte dos amantes. Só o que restou foi esta lenda.
Meilan também sobreviveu à própria morte. Na fábula chinesa do século XII d.C. "A Deusa de Jade", Meilan era a filha mimada de 15 anos de um alto funcionário de Kaifeng — até se apaixonar por Chang Po, um rapaz vivaz com dedos longos e finos e um dom para entalhar o jade. "Desde que céu e terra foram criados, você foi feita para mim e eu fui feito para você e não a deixarei partir", declarou Chang Po a Meilan certa manhã no jardim da família dela.5 Mas estes amantes eram de classes diferentes na rígida hierarquia social da China. Desesperados, eles fugiram — e logo foram encontrados. Ele escapou. Ela foi enterrada viva no jardim do pai. Mas a história de Meilan ainda assombra a alma de muitos chineses.
Romeu e Julieta, Páris e Helena, Orfeu e Eurídice, Abelardo e Heloísa, Tróilo e Créssida, Tristão e Isolda: milhares de poemas, canções e histórias românticas atravessaram séculos, vindos da Europa ancestral, bem como do Oriente Médio, do Japão, China, Índia e de cada sociedade que deixou registros escritos.
Mesmo quando não possuem documentos escritos, os povos deixaram evidências de sua paixão. Na verdade, em um levantamento de 166 culturas variadas, antropólogos encontraram provas do amor romântico em 147, quase 90% delas.6 Nas 19 sociedades restantes, os cientistas simplesmente não conseguiram examinar este aspecto da vida das pessoas. Mas da Sibéria ao interior da Austrália e à Amazônia, as pessoas cantavam canções, compunham poemas de amor e contavam mitos e lendas do amor romântico. Muitas fazem a magia do amor — levando amuletos e encantamentos ou servindo condimentos ou preparados para estimular o ardor romântico. Alguns matam os amantes. Outros se matam. Muitos adoecem de uma tristeza tão profunda que mal podem comer ou dormir.
A partir da leitura de poemas, canções e histórias de povos de todo o mundo, passei a acreditar que a capacidade para o amor romântico está firmemente entrelaçada no tecido do cérebro humano. O amor romântico é uma experiência humana universal.
O que é este sentimento volátil, com freqüência incontrolável, que se apodera da mente, trazendo alegria em um momento e desespero no outro?7
O estudo do amor
"Oh, diga-me a verdade sobre o amor", exclamou o poeta W. H. Auden. Para entender o que realmente leva a esta profunda experiência humana, investiguei a literatura psicológica sobre o amor romântico, selecionando aquelas características, sintomas ou problemas físicos que foram repetidamente mencionados. Não é de surpreender que este poderoso sentimento seja um complexo de muitas características específicas.8
Depois, para me convencer de que estas características da paixão romântica são universais, eu as usei como a base para um questionário que planejei sobre o amor romântico. E com a assistência de Michelle Cristiani, na época aluna de pós-graduação na Universidade Rutgers, e da Dra. Mariko Hasagawa e do Dr. Toshikazu Hasagawa, da Universidade de Tóquio, distribuí este levantamento entre homens e mulheres na Universidade Rutgers, em Nova Jersey, e na Universidade de Tóquio.
A pesquisa começava: "Este questionário trata de ‘estar amando’, as sensações de estar enfeitiçado, apaixonado, ou ter uma forte atração romântica por alguém.
"Se você não está atualmente ‘amando’ alguém, mas se sentiu muito apaixonado por alguém no passado, por favor responda às perguntas com esta pessoa em mente." Os participantes eram depois indagados sobre várias questões demográficas, idade, situação financeira, religião, etnia, orientação sexual e estado civil. Também perguntei sobre seus casos de amor. Entre as perguntas: "Quanto tempo você ficou apaixonado?" "Qual o percentual diário, em média, que você pensa nesta pessoa?" E "Você às vezes se sente como se seus sentimentos estivessem fora de seu controle?"
Depois vinha o corpo do questionário (ver Apêndice). Continha 54 afirmativas, como: "Tenho mais energia quando estou com ______." "Meu coração dispara quando ouço a voz de _______ ao telefone." E "Quando estou em aula/no trabalho, minha mente vagueia para _______." Elaborei estas perguntas para que refletissem as características mais comumente associadas com o amor romântico. Os participantes tinham de indicar a que ponto concordavam com cada pergunta numa escala de sete pontos que ia de "discordo enfaticamente" a "concordo enfaticamente". Um total de 437 americanos e 402 japoneses responderam ao questionário. Depois os estatísticos MacGregor Suzuki e Tony Oliva reuniram os dados e fizeram uma análise estatística.
Os resultados foram assombrosos. Idade, gênero, orientação sexual, afiliação religiosa, grupo étnico: nenhuma destas variáveis humanas fizeram muita diferença nas respostas.
Por exemplo, pessoas de diferentes grupos etários responderam, sem nenhuma diferença estatística significativa, a 82% das afirmativas. As pessoas com mais de 45 anos relataram estar tão apaixonadas quanto aquelas que tinham menos de 25 anos. Heterossexuais e homossexuais deram respostas semelhantes em 86% das questões. Em 87% das perguntas, os homens e mulheres americanos responderam praticamente da mesma forma: havia poucas diferenças de gênero. Americanos "brancos" e "outros" responderam similarmente em 82% das perguntas: a raça quase não tinha importância no ardor romântico. Católicos e protestantes não exibiram variação significativa em 89% das afirmativas: a afiliação a igrejas não tinha importância. E quando os grupos mostraram diferenças "estatisticamente significativas" em suas respostas, em geral um grupo era um pouco mais apaixonado do que o outro.
As maiores diferenças estavam entre os americanos e os japoneses. Em mais de 43 questões onde mostraram variações estatísticas significativas, uma nacionalidade simplesmente expressou uma paixão romântica um pouco maior. E todas as 12 perguntas que mostravam diferenças drásticas pareciam ter explicações culturais óbvias. Por exemplo, somente 24% dos americanos concordaram com a afirmativa: "Quando estou falando com _____, com freqüência tenho medo de dizer alguma coisa errada", enquanto colossais 65% de japoneses concordaram com esta declaração. Suspeito que esta variação específica tenha ocorrido porque os jovens japoneses em geral têm relações mais formais com o sexo oposto do que os americanos. Assim, considerando tudo, nestas duas sociedades muito diferentes, homens e mulheres eram muito semelhantes em seus sentimentos de paixão romântica.
Amor romântico. Amor obsessivo. Amor apaixonado. Paixão. Chame como quiser, homens e mulheres de cada época e cultura foram "enfeitiçados, amolados e aturdidos" por este poder irresistível. Estar apaixonado é universal à humanidade; faz parte da natureza humana.9
Além disso, esta magia ataca a cada um de nós praticamente da mesma maneira.
"Significado especial"
Uma das primeiras coisas que acontecem quando você se apaixona é que você vive uma mudança drástica na consciência: seu "objeto de amor" assume o que os psicólogos chamam de "significado especial". Seu amado torna-se singular, único e sumamente importante. Como disse um enamorado, "Todo o meu mundo se transformou. Eu tinha um novo centro, e este centro era Marylin".10 Romeu, de Shakespeare, expressou este sentimento mais sucintamente, dizendo de sua adorada: "Julieta é o Sol".
Antes que o relacionamento se desenvolva para o amor romântico, você pode se sentir atraído por vários indivíduos diferentes, voltando sua atenção para um, depois para outro. Mas por fim você começa a concentrar a paixão em apenas um. Emily Dickinson chamou este mundo particular de "o reino do você".
Este fenômeno está relacionado com a incapacidade humana de sentir paixão romântica por mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Em meu levantamento, 79% dos homens e 87% das mulheres disseram que não iriam a um encontro amoroso com outra pessoa se seu amado não estivesse disponível (Apêndice, nº 19).
Atenção concentrada
A pessoa possuída pelo amor concentra a atenção quase completamente no amado, com freqüência em detrimento de tudo e todos em torno dela, inclusive trabalho, família e amigos. Ortega y Gasset, o filósofo espanhol, chama isto de "um estado anormal de atenção que ocorre em um homem normal". Esta atenção concentrada é um aspecto essencial do amor romântico.
Homens e mulheres apaixonados também se concentram em todos os acontecimentos, canções, cartas e outras coisinhas que eles associaram com o amado. O tempo que parou no parque para mostrar a ela uma flor; a noite em que ela atirou limões para ele preparar as bebidas: para o possuído pelo amor, estes momentos casuais estão vivos. Setenta e três por cento dos homens e 85% das mulheres em meu levantamento lembraram-se de coisas banais que seu amado disse e fez (Apêndice, nº 46). E 83% dos homens e 90% das mulheres reprisam estes episódios preciosos em sua mente enquanto refletem sobre seus amados (Apêndice, nº 52).
Bilhões de outros amantes provavelmente sentiram um surto de ternura quando pensaram nos momentos passados com um namorado. Um exemplo asiático tocante disto vem de um poema chinês do século IX, "A Esteira de Bambu", de Yuan Chen. Chen angustiou-se: "Não suporto guardar/ a esteira de bambu:/ na noite em que te trouxe para casa,/ eu te vi desenrolá-la."11 Para Chen, um objeto cotidiano tinha adquirido um poder icônico.
O conto do século XII, Lancelot, de Chrétien de Troyes, ilustra este mesmo aspecto da paixão romântica. Neste épico, Lancelot encontra o pente da rainha Guinevere na estrada depois que ela e seu cortejo passam. Vários de seus cabelos dourados estão emaranhados nos dentes. Como escreveu de Troyes, "Ele começou a adorar os cabelos dela; mil vezes ele os tocou com os olhos, a boca, a testa e a face".12
Engrandecendo o amado
O apaixonado também começa a superdimensionar, até a exagerar aspectos minúsculos do adorado. Se pressionados, quase todos os amantes podem relacionar as coisas de que não gostam em seu amor. Mas eles deixam estas percepções de lado ou se convencem de que os defeitos são únicos e encantadores. "Assim os amantes governam a causa de sua paixão/ para amar suas damas por suas falhas", refletiu Molière. Concordo. Alguns chegam a adorar seus amados por seus defeitos.
E os amantes idolatram as qualidades positivas de seus amados, desprezando flagrantemente a realidade.13 É a vida através de lentes cor-de-rosa, o que os psicólogos chamam de "efeito da lente cor-de-rosa". Virginia Woolf descreveu vividamente esta miopia ao dizer: "Mas o amor (...) é apenas uma ilusão. A história que alguém compõe mentalmente sobre outra pessoa. E sabe-se o tempo todo que não é verdade. É claro que se sabe; por que o eterno acalentar não destrói a ilusão".
Nossa amostra de americanos e japoneses certamente ilustra este efeito da lente cor-de-rosa. Cerca de 65% dos homens e 55% das mulheres no levantamento concordaram com a afirmativa: "______ tem alguns defeitos, mas eles não me incomodam de jeito nenhum" (Apêndice, nº 3). E 64% dos homens e 61% das mulheres concordaram com a afirmativa: "Eu amo tudo em ______" (Apêndice, nº 10).
Como nos iludimos quando amamos. Chaucer estava certo: "O amor é cego."
"Pensamento intrusivo"
Um dos principais sintomas do amor romântico é a meditação obsessiva sobre o amado. É conhecida pelos psicólogos como "pensamento intrusivo". Você simplesmente não consegue tirar o amado da cabeça.
Exemplos de pensamento intrusivo abundam na literatura mundial. O poeta chinês do século IV, Tzu Yeh, escreveu: "Como posso não pensar em ti...".14 Um poeta japonês do século VIII lamentou: "Meu desejo não tem tempo, embora cesse". Giraut de Borneil, um trovador da França do século XII, cantou: "Por amar demais (...) Tão terrivelmente meus pensamentos me atormentam".15 E o nativo maori da Nova Zelândia expressou seu sofrimento com estas palavras: "Deito-me acordado toda noite,/ Para o amor me pilhar em segredo."
Mas talvez o exemplo mais admirável de pensamento intrusivo venha da obra-prima medieval de Wolfram von Eschenbach, Parzival. Nesta história, Parzival estava a meio galope em seu corcel quando viu três gotas de sangue na neve de inverno, vertido por um pato selvagem que tinha sido ferido por um falcão. Isto o recordou da tez carmim e alabastro de sua esposa, Condwiramurs. Petrificado, Parzival senta-se em contemplação, congelado em seus estribos. "E assim ele refletiu, perdido em pensamentos, até que seus sentidos/ desertaram-no. O poderoso amor o fez escravo."16
Infelizmente, Parzival segurava sua lança erguida — um sinal cavalheiresco de desafio. Logo depois, cavaleiros que estavam acampados em uma campina próxima com o rei Artur perceberam e galoparam para um combate com ele. Foi somente quando os seguidores de Parzival colocaram um cachecol sobre as gotas de sangue que ele se sacudiu de seu transe de amor, abaixou a arma e evitou uma batalha mortal.
Poderoso é o amor. Não é de surpreender que 79% dos homens e 78% das mulheres em meu levantamento tenham relatado que quando estão em aula ou no trabalho sua mente se volta continuamente para o amado (Apêndice, nº 24). E 47% dos homens e 50% das mulheres concordaram que "Não importa por onde comece, minha mente sempre termina pensando em ______" (Apêndice, nº 36). Outras pesquisas relatam descobertas semelhantes. Os participantes dizem que pensam em seu "objeto de amor" por mais de 85% das horas de vigília.17
Como Milton foi perspicaz em Paraíso perdido ao colocar Eva dizendo a Adão: "Contigo conversando, esqueço-me de todo o tempo".
Fervor emocional
Dos 839 participantes americanos e japoneses de meu levantamento do amor romântico, 80% dos homens e 79% das mulheres concordaram com a declaração: "Quando tenho certeza de que _____ está apaixonado por mim, me sinto mais leve do que o ar" (Apêndice, nº 32).
Nenhum aspecto isolado de "estar apaixonado" é tão familiar ao amante do que a torrente de emoções intensas que inundam sua mente. Alguns se tornam dolorosamente envergonhados ou desastrados quando na presença do amado. Alguns ficam pálidos. Alguns ruborizam. Alguns tremem. Outros gaguejam. Alguns suam. Alguns ficam com os joelhos frouxos, sentem-se tontos, ou têm "borboletas no estômago". Outros relatam uma respiração acelerada. E muitos dizem sentir o coração em brasa.
Catulo, o poeta romano, certamente foi arrebatado. Escrevendo para sua amada, ele disse: "Você me enlouquece./ Ver você, Minha Lésbia, tira-me o fôlego./ Minha língua congela, meu corpo/ enche-se de chamas".18 Ono No Komachi, uma poetisa japonesa do século IX, escreveu: "Deito-me desperta, quente/ as chamas crescentes da paixão/ explodindo, inflamando meu coração".19 A mulher do Cântico dos Cânticos, a carta de amor hebreu composta entre 900 e 300 a.C., lamentava: "Desfaleço de amor".20 E o poeta americano Walt Whitman descreveu este turbilhão emocional perfeitamente, ao dizer: "Esta furiosa tempestade galopa por mim — tremo apaixonadamente".21
Os amantes cavalgam um jaguar de contentamento tão veloz que muitos acham difícil comer ou dormir.

Energia intensa
A perda de apetite e sono tem uma relação direta com outra das sensações esmagadoras do amor: uma enorme energia. Como disse a um antropólogo um jovem da ilha de Mangaia, no Pacífico Sul, quando pensava em sua amada ele "se sentia como se saltasse no céu!"22 Sessenta e quatro por cento dos homens e 68% das mulheres de nosso levantamento também relataram que o coração acelerava quando ouviam a voz do amado ao telefone (Apêndice, nº 9). E 77% dos homens e 76% das mulheres disseram ter uma explosão de energia quando estavam com o amado (Apêndice, nº 17).
Bardos, menestréis, poetas, dramaturgos, romancistas: homens e mulheres cantaram por séculos esta química energizante, bem como a gagueira desconcertante e o nervosismo, o coração martelando e a falta de fôlego que podem acompanhar o amor romântico. Mas de todos os que discutiram este pandemônio físico e psíquico, ninguém foi tão ilustrativo como Andreas Capellanus, ou André Capelão, um erudito francês da década de 1180 que circulava nas altas rodas cortesãs e escreveu Tratado do amor cortês, um clássico literário de todos os tempos.
Foi naquele século que surgiu a tradição do amor cortês na França. Este código prescrevia a conduta do amante em relação à amada. O amante era freqüentemente um trovador — um poeta muito culto, músico e cantor, com freqüência das fileiras da cavalaria. Em muitos casos sua amada era uma mulher casada com o senhor de uma família distinta da Europa. Estes trovadores compunham e depois cantavam versos muito românticos para idolatrar e lisonjear a senhora da casa.
Todavia esperava-se que aqueles "romances" fossem castos — e observassem rigidamente os códigos complexos da conduta cavalheiresca. Assim, em seu livro, Capelão codificou as regras do amor cortês. Sem saber, ele também relacionou muitas das principais características do amor romântico, entre elas a turbulência interior do amante. Como ele expressou adequadamente, "ao ter um vislumbre súbito de sua amada, o coração do amante começa a palpitar". "Todo amante regularmente empalidece na presença de sua amada."23 E "Um homem atormentado pelo pensamento do amor come e dorme muito pouco".24
O clérigo sofisticado também falou do pensamento intrusivo que vivem os amantes, declarando: "tudo o que um amante faz termina na idéia de sua amada". E "Um verdadeiro amante está contínua e ininterruptamente obcecado pela imagem da amada". Ele também reconheceu claramente que o amante concentra toda sua atenção em uma só pessoa quando ama, ao dizer: "Ninguém pode amar duas pessoas ao mesmo tempo".25
Os aspectos fundamentais do amor romântico não mudaram em quase mil anos.
Oscilações de humor: do êxtase ao desespero
"Ele deriva pela água azul/ sob a lua clara,/ pegando lírios brancos no Lago Sul./ Cada flor de lótus/ fala de amor/ até seu coração se despedaçar."26 Para o poeta chinês do século VIII Li Po, o romance era doloroso.
As sensações do amor vão às alturas e despencam. Se o amado inunda o amante de atenção, se ele liga regularmente, escreve e-mails afetuosos ou se une ao amante para uma tarde ou noitinha de comida e diversões, o mundo irradia. Mas se o adorado parece indiferente, aparece tarde ou sequer aparece, deixa de responder aos e-mails, telefonemas ou cartas, ou manda algum sinal negativo, o amante começa a se sentir desesperado. Apáticos, deprimidos, estes galanteadores ficam melancólicos até que consigam explicar satisfatoriamente seus atos, aliviar seus corações menosprezados e renovar a caça.
A paixão romântica pode produzir uma variedade de mudanças estonteantes de humor que vão da exultação, quando o amor é retribuído, à ansiedade, desespero ou até raiva quando o ardor romântico é ignorado ou rejeitado. Como coloca o escritor suíço Henri Frederic Amiel, "Quanto mais um homem ama, mais ele sofre". Os povos tâmeis do sul da Índia chegam a ter um nome para esta enfermidade. Eles chamam este estado de sofrimento amoroso de "mayakkam", que significa intoxicação, tonteira e ilusão.
Não chega a me surpreender que 72% dos homens e 77% das mulheres em meu levantamento discordem da afirmativa: "O comportamento de ______ não tem nenhum efeito sobre meu bem-estar emocional" (Apêndice, nº 41). E 68% dos homens e 56% das mulheres apóiam a afirmativa: "Meu estado emocional depende de como _______ se sente em relação a mim" (Apêndice, nº 37).
O desejo de união emocional
"Venha a mim em meus sonhos, e então/ De dia eu estarei novamente bem./ Pois assim a noite compensará/ o desejo desesperançado do dia".*27 Os amantes anseiam por união emocional com um amado, como sabia o poeta Matthew Arnold.28 Sem esta conexão com um amado, eles se sentem incompletos ou vazios, como se lhes faltasse uma parte essencial de si mesmos.
Esta necessidade assoberbante de união emocional, tão característica do amante, é memoravelmente expressa em O banquete, o relato de Platão de um jantar em Atenas em 416 a.C. Nesta noite festiva, algumas das mentes mais brilhantes da Grécia clássica reuniram-se para jantar na casa de Agaton. Enquanto se reclinam em seus divãs, um convidado propõe que se divirtam com um tópico de discussão, apenas esportivamente: cada um deles deveria descrever e louvar o Deus do Amor.
Todos concordaram. A flautista foi dispensada. Depois, um por um, eles usaram sua vez para louvar o Deus do Amor. Alguns consideraram esta figura sobrenatural a mais "antiga", a mais "honrada" ou a menos "preconceituosa" de todos os deuses. Outros sustentaram que o Deus do Amor era "jovem", "sensível", "poderoso" ou "bom". Mas não Sócrates. Ele começou sua homenagem contando o diálogo que teve com Diotima, a esposa sábia de Mantinea. Falando do Deus do Amor, ela disse a Sócrates: "Ele sempre vive em um estado de necessidade".29
"Um estado de necessidade." Talvez nenhuma expressão em toda a literatura tenha apreendido com tanta clareza a essência do amor romântico apaixonado: Necessidade. Em meu levantamento, 86% dos homens e 84% das mulheres concordaram com a afirmativa: "Eu espero de todo coração que _______ esteja tão atraído(a) por mim como estou por ele/ela" (Apêndice, nº 30).
Este desejo de se fundir com o amado permeia a literatura mundial. O poeta romano do século VI d.C. Paulo Silentiarius escreveu: "E ali repousam os amantes, os lábios selados/ delirantes, infinitamente sedentos,/ cada um deles esperando para entrar completamente no outro".30 Yvor Winters, poeta americano do século XX, escreveu: "Possam nossos sucessores nos selar em uma só urna,/ Um só espírito nunca retorna".*31 E Milton expressou isto perfeitamente em Paraíso perdido quando Adão diz a Eva: "Nós somos um,/ Uma carne; perder-te é perder a mim mesmo".
O filósofo Robert Solomon acredita que este desejo intenso é a principal razão para o amante dizer "eu te amo". Isto não é uma declaração do fato, mas um pedido de confirmação. O amante quer ouvir aquelas poderosas palavras, "eu também te amo".32 Tão profunda é esta necessidade de união emocional com o amado que os psicólogos acreditam que o senso de identidade do amante se tolda. Como disse Freud, "A esta altura, o estado de ser no amor ameaça obliterar as fronteiras entre ego e objeto".
A romancista Joyce Carol Oates apreendeu vividamente esta sensação de jubilosa fusão quando escreveu: "Se eles se virarem de repente para nós, recuaremos/ a pele se arrepia úmida, sutilmente/ seremos rasgados em duas pessoas?"
À procura de pistas
Quando os amantes não sabem se seu amor é apreciado e retribuído, eles se tornam hipersensíveis aos sinais enviados pelo adorado. Como escreveu Robert Graves, "Ouvindo uma batida na porta, esperando por um sinal". Em meu levantamento, 79% dos homens e 83% das mulheres relataram que quando se sentem fortemente atraídos por alguém, dissecam os atos do amado, procurando por pistas sobre seus sentimentos em relação a ele (Apêndice, nº 21). E 62% dos homens e 51% das mulheres disseram que às vezes procuraram por significados alternativos para as palavras e gestos do amado (Apêndice, nº 28).
Mudança de prioridades
Muitos apaixonados também mudam o estilo do guarda-roupa, os maneirismos, os hábitos, às vezes até os valores para conquistar o ser amado. Um novo interesse por golfe, aulas de tango, colecionar antigüidades, um novo corte de cabelo, Mozart em vez de música country, até se mudar para uma nova cidade ou dar início a uma nova carreira: homens e mulheres fisgados pelo amor formam todo tipo de novos interesses, crenças e estilos de vida para agradar aos seus amados.
O campeão do amor cortesão do século XII, André Capelão, resumiu este impulso escrevendo as palavras: "O amor não pode negar nada ao amor".33 Enquanto um americano embriagado de amor coloca isso rudemente: "O que quer que ela gostasse, eu gostava".34 Ele era um entre muitos. Setenta e nove por cento dos americanos e 70% das americanas em nosso levantamento concordaram com a afirmativa: "Gosto de manter minha programação em aberto para o caso de ______ estar livre e podermos nos ver" (Apêndice, nº 47).
Os amantes reorganizam a vida para acomodar o ser amado.
Dependência emocional
Os amantes também se tornam dependentes do relacionamento, muito dependentes. Como o Marco Antônio de Shakespeare declarou a Cleópatra, "Tinha eu o coração atado por fios a teu leme". Um antigo poema hieroglífico egípcio descrevia a mesma dependência ao dizer: "Meu coração é um escravo/ se ela me abraça".35 O trovador do século XII Arnaut Daniel escreveu: "Sou dela da cabeça aos pés".36 Mas Keats foi o mais apaixonado, escrevendo: "Em silêncio, para ouvir teu terno respirar,/ E assim viver para sempre — ou desvanecer até a morte".*
Como os amantes são tão dependentes de um amado, eles sofrem uma terrível "ansiedade de separação" quando não estão em contato. Um poema japonês, escrito no século X, padece deste desespero. "A manhãzinha cintila/ no brilho difuso/ da primeira luz. Sufocado de tristeza,/ Eu te ajudo com tuas roupas."37
Os amantes são marionetes que balançam das cordas do coração do outro.
Empatia
Conseqüentemente, os amantes sentem uma enorme empatia pelo amado. Em meu levantamento, 64% dos homens e 76% das mulheres concordaram com a afirmativa: "Fico feliz quando _____ está feliz e triste quanto ele/ela está triste" (Apêndice, nº 11).
O poeta e. e. cummings escreveu encantadoramente sobre isso, dizendo: "ela ria sua alegria ela chorava sua tristeza". Muitos amantes chegam a se dispor a se sacrificarem por seu amado. Talvez o sacrifício de Adão por Eva seja a oferta mais dramática de toda a literatura universal. Como Milton a descreveu, depois de descobrir que Eva havia comido da maçã proibida, Adão decide comer ele mesmo da maçã — o que ele sabe que levará à expulsão deles do Jardim do Éden e à morte. Adão diz: "pois contigo/ por certo minha resolução é morrer".38
A adversidade aumenta a paixão
A adversidade com freqüência alimenta a chama. Chamo este curioso fenômeno de "frustração-atração", mas é mais conhecido como "efeito Romeu e Julieta". Os obstáculos sociais ou físicos acendem a paixão romântica.39 Permitem que a realidade seja descartada e que nos concentremos nas enormes qualidades do outro. Até as discussões ou rompimentos temporários podem ser estimulantes.
Um dos exemplos mais divertidos da literatura de como a adversidade aumenta o romance é a peça de um ato de Tchekov, O urso.40
Neste drama, um proprietário de terras mal-humorado, Grigori Stepanovitch Smirnov, aparece na casa de uma jovem viúva para pegar um dinheiro que o marido morto devia a ele. A mulher se recusa a pagar um cópeque que seja. Ela está de luto, explica, e grita bruscamente para ele: "Não estou com espírito para me preocupar com questões monetárias". Isto lança Smirnov num discurso contra todas as mulheres — chamando-as de hipócritas, falsas, cruéis e ilógicas. "Brrrr!", ele diz com veemência, "Tremo de fúria". A raiva dele incita a dela e eles começam a trocar insultos aos gritos. Logo ele apela para um duelo. Aflita para fazer um buraco na cabeça dele, a viúva pega as pistolas do marido morto e eles tomam posições.
Mas à medida que o rancor cresce, aumenta também o respeito mútuo — e a atração. De repente Smirnov exclama: "Agora, isto é que é mulher! Eu bem vejo! Uma mulher de verdade! Não é uma choramingas, não é uma covarde, é um meteoro, um foguete, é uma arma de fogo! É uma vergonha ter de matá-la!" Um minuto depois ele declara um amor imortal e pede a ela que seja esposa dele. Quando os criados dela correm para a sala para defender sua senhora com machados, ancinhos e forcados, tropeçam nos amantes — empolgados num abraço louco.
Esta estranha relação entre a adversidade e o ardor romântico é vital em todos os amantes das grandes lendas do mundo. Se incitados por dificuldades de um ou outro tipo, eles só se amam ainda mais.
A história ocidental mais conhecida desse tipo, é claro, é a tragédia de Shakespeare Romeu e Julieta. Aqueles jovens amantes da Verona do século XVI são apanhados em uma disputa amarga entre duas poderosas famílias, os Montéquio e os Capuleto. Romeu é um Montéquio, Julieta uma Capuleto. Todavia Romeu se apaixona por Julieta no momento em que a vê em uma festa da família, exclamando: "Oh, ela ensina o archote a luzir!/ Conheceria meu coração até hoje o amor? Abjure-o, olhe!/ Nunca soube até esta noite o que era a beleza".41 Julieta também sucumbe à flecha do Cupido. Quando Romeu parte do banquete, ela pergunta à ama: "Vai perguntar como se chama. Se for casado,/ Meu túmulo será meu leito nupcial".42 A peça se desenrola numa série de obstáculos e confusões que só intensificam a paixão dos dois.
Sessenta e cinco por cento dos homens e 73% das mulheres em meu levantamento concordaram com a afirmativa: "Eu nunca desisto de amar _____, mesmo quando as coisas ficam ruins" (Apêndice, nº 26). E 75% dos homens e 77% das mulheres concordaram com a afirmativa: "Quando o relacionamento com _____ tem um contratempo, eu me esforço mais para que as coisas dêem certo" (Apêndice, nº 6).
Um dos resultados inesperados de meu levantamento quase certamente pode ser atribuído ao papel da adversidade no amor. Os participantes homossexuais, tanto homens como mulheres, relataram mais turbilhão emocional do que os heterossexuais. Estes indivíduos eram mais atormentados pela insônia, perda de apetite e o desejo de união emocional com um amado. Acho que este sofrimento físico ocorre, pelo menos em parte, devido aos obstáculos sociais que devem ser superados por muitos amantes homossexuais.
Os que responderam a meu questionário enquanto pensavam num ex-amante também pareciam mais frágeis emocionalmente. Também eles tiveram dificuldades para comer e dormir. Ficavam mais tímidos e desajeitados perto de seu antigo amado. Sofriam mais de "pensamento intrusivo" e mais oscilações de humor. E com mais freqüência relataram ter um coração acelerado quando pensavam em sua antiga chama. Suspeito de que muitos destes participantes foram rejeitados pelo ser amado — e esta adversidade aumentou seu ardor romântico.
Como barcos a remo em um mar turbulento, homens e mulheres viajam pelas ondas da angústia e da alegria que são o amor romântico. E os obstáculos intensificam estas emoções. Se seu amado é casado com outra pessoa, se ele mora em outro continente, se vocês falam línguas diferentes, provêm de grupos étnicos diferentes ou de diferentes partes da cidade, este obstáculo pode aumentar a paixão romântica. Dickens disse sobre isso: "O amor com freqüência cresce de forma mais abundante na separação e sob as circunstâncias mais difíceis". É bem verdade.
Esperança
"Digamos que eu pudesse viver em esperança", argumenta o rei Pirro com Andrômaca no drama de amor e morte de Racine. Por que os amantes devem continuar a ter esperança, mesmo quando os dados lançados pela vida saem incansavelmente contra eles? A maioria ainda espera que o relacionamento renasça — até anos depois de ter terminado amargamente. A esperança é outra característica predominante do amor romântico.
Um poema encantador do século XVI, de Michael Drayton, expressa este otimismo. Ele começa: "Como não há remédio, vem, beijemo-nos e digamos adeus!/ Não, nada mais tenho, não terás mais nada de mim;/ E estou feliz, sim, de todo coração,/ Por me libertar assim tão honestamente/ Eternos apertos de mãos, anulem-se os votos;/ E quando nos reencontrarmos um dia,/ Que não se veja em teu semblante,/ que resta um mínimo de amor em nós". Com estas palavras Drayton declara, com aparente confiança, que o caso está finalmente acabado. Mas, no final do poema, ele de repente muda de tom. Vencido pela esperança, ele afirma que o "Amor" ainda pode ser salvo: "Se tivesses entregado tudo a ele,/ Da morte à vida, ainda assim o redimirias."*43
Acho que esta tendência à esperança se tornou arraigada no cérebro humano eras atrás para que nossos antepassados buscassem obstinadamente parceiros em potencial até que expirasse a última faísca de possibilidade.
Uma ligação sexual
"Eu preferia morrer cem vezes a ficar sem o teu doce amor. Eu te amo. Eu te amo desesperadamente. Eu te amo como amo minha própria alma."44 Assim declarou Psiquê ao marido, Eros, em O asno de ouro, romance do século II de Apuleio. "Ardendo de desejo", continua a história, "ela se inclinou e o beijou impulsivamente, impetuosamente, com um beijo depois de outro depois de outro beijo, temerosa de que ele despertasse antes que ela tivesse terminado."45
A poesia de todo o mundo atesta o intenso anseio do amante por união sexual com o amado, outra característica básica do amor romântico.
No Cântico de Salomão, a mulher evoca: "Oh vento norte, desperta. /Vento sul, levanta-te./ Soprai em meu jardim/ e levai minhas fragrâncias./ Deixai que meu amor entre neste jardim/ e coma de seu doce fruto".46 Inanna, rainha da antiga Suméria, ficou extasiada com a sexualidade de Dumuzi, dizendo: "Oh, Dumuzi! Sua plenitude é meu deleite!"47 Mas o mais doce para meus ouvidos é o poema inglês anônimo que lamenta: "Vento oeste, quando deixarás de soprar?/ a chuva fina pode cair,/ Cristo, se minha amada estivesse em meus braços/ E eu novamente em minha cama!"
Freud, assim como muitos eruditos e leigos, sustentava que o desejo sexual é um componente central do amor romântico.48 Não era uma idéia nova. Quem estudou o Kama Sutra, o manual do amor da Índia do século V, sabe que a palavra "love", "amor", vem do sânscrito "Lubh", que significa "desejar".
Certamente faz sentido que as sensações do amor romântico sejam entrelaçadas com o desejo sexual. Afinal, se a paixão romântica evoluiu entre nossos antepassados para motivá-los a concentrar sua energia para o acasalamento em um indivíduo "especial" pelo menos até que a inseminação tenha sido concluída (como sustentarei nos capítulos subseqüentes), então a paixão romântica deve estar relacionada com o desejo sexual.
Os resultados de meu levantamento apóiam esta proposição. Substanciais 73% dos homens e 65% das mulheres têm devaneios com fazer sexo com o amado (Apêndice, nº 34).

Exclusividade sexual
Os amantes também querem exclusividade sexual. Eles não desejam ter seu relacionamento "sagrado" maculado por terceiros. Quando alguém vai para a cama com "apenas um amigo", ele com freqüência não se preocupa muito se o parceiro sexual também está copulando com outro. Mas uma vez que um homem ou uma mulher se apaixonam e começam a ansiar por união emocional com um amado, querem profundamente que seu parceiro permaneça sexualmente fiel — a eles.
Muitas das histórias de amor do mundo refletem esta possessividade sexual, bem como o desejo do amante de manter sua fidelidade sexual. Por exemplo, enquanto separado de Isolda, a Justa, Tristão casou-se com outra mulher com o mesmo nome, Isolda das Brancas Mãos — em grande parte porque esta mulher lhe trazia muito do apelo da amada. Mas Tristão não consegue consumar o casamento. Quando, na lenda árabe, Laila fica noiva de alguém que não era seu amado Majnun, ela também evita o leito nupcial. E cerca de 80% dos homens e 88% das mulheres em meu levantamento concordaram com a afirmativa: "Ser sexualmente fiel é importante quando você está apaixonado" (Apêndice, nº 42).
De todas as propriedades do amor romântico, este anseio por exclusividade sexual é o mais interessante para mim. Provavelmente evoluiu por dois motivos essenciais: para proteger os homens ancestrais de serem traídos e criarem o filho de outro; e para proteger as mulheres ancestrais de perderem para uma rival um marido em potencial e pai para seus filhos. Este desejo por exclusividade sexual permitiu que nossos antepassados protegessem seu precioso DNA enquanto gastavam quase todo o seu tempo e energia cortejando alguém que adoravam.
Mas, junto com o impulso para garantir a fidelidade sexual durante a corte, veio uma característica menos atraente do amor romântico. O "monstro de olhos verdes" de Shakespeare, o ciúme.
Ciúme: a "ama-de-leite do amor"
Em seu livro sobre as regras do amor cortês, Capelão escreveu: "Quem não sente ciúme não é capaz de amar". Ele chamava o ciúme de "ama-de-leite do amor" porque acreditava que ele nutria a chama romântica.49
O sagaz clérigo, como sempre, estava certo. Em toda sociedade em que os antropólogos estudaram a paixão romântica, os dois sexos eram ciumentos, muito ciumentos.50 Como alertou o I Ching, o livro chinês da sabedoria escrito mais de três mil anos atrás, "Um vínculo estreito somente é possível entre duas pessoas; um grupo de três engendra ciúme".

 
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